domingo, agosto 03, 2003

Análise de canções Tradicionais Infantis (Parte 3)

Para acabar esta minha trilogia de análise a canções infantis, vejam esta:
"Era uma vez um cavalo que vivia num lindo carrossel Tinha orelhas de burro E o rabo era feito de papel
A correr trá lá lá, a saltar trá lá lá, cavalinho não saía do lugar " ( mais à frente na canção ) Ele anda com rodas, eu ando sem pés..."

Ao contrário da última canção em análise, nesta justifica-se todas as características de "mutante"que o cavalo possa ter, pois como está bem explícito na letra, o cavalo não é real, é um cavalo de carrossel (diga-se de passagem, um carrossel de merda onde os cavalos parecem burros). Aqui surge outra questão que se relaciona com as metáforas mais ou menos profundas e obviamente inadequadas para crianças de 5 anos! A metáfora em volta do cavalo/carrossel não é imediatamente desvendada pela miudagem. Como é que o cavalo corre e salta sem sair do lugar? Porque é que eu ando sem pés? Realmente o cavalo não sai do lugar tendo em conta o referencial carrossel, mas se o referencial escolhido for a terra, o cavalo sai do lugar pois anda à roda num movimento circular uniforme. Existem aqui questões relacionadas com física que só o 12º ano de escolaridade na área de ciências permite compreender. O autor mistura, por isso, a parte de mecânica desta disciplina com o puro deleite poético. "Eu ando sem pés..." é um excelente jogo metafórico onde realmente nós andamos sem pés, pois andamos em cima do cavalo que por sua vez anda às voltas no carrossel. Não se deve confundir com o puro esquizofrenismo da música anterior onde o grotesco era a essência da canção. O autor, embora invulgarmente brilhante, não soube perceber que a canção não é adequada a jovens com menos de 17 anos.
Existe ainda outro pormenor que está relacionado com o desejo recalcado do cavalo em querer sair do carrossel. O autor não esconde o dramatismo desta vida inanimada que quer fugir e correr o mundo mas não pode pois está empalado no carrossel (referências a "Pinóquio"). Mais uma vez o autor não é explícito e obriga a raciocínios de abstracção impossíveis às idades alvo desta canção.

Concluo a minha análise dizendo apenas que as músicas tradicionais infantis deveriam ser reformadas pois contêm violência explícita ("Atirei o pau ao gato"), demência e referências bizarras ("Dão balalão..") e metáforas e contextos desadequados ("Cavalinho no carrossel"). ST