Princípios para um mundo perfeito*

Eu tenho um sonho. Sonho que na última semana do ano ninguém me diz “então até para o ano”. Sonho que na primeira semana do ano seguinte nenhuma alma me atire com “já não te via desde o ano passado”. Eu tenho um sonho. Mais um, eu sei, mas este também me parece importante. Sonho que nenhuma criança, nenhum adulto, independentemente da raça, do sexo, do código postal ou de preferir uma wii ou uma playstation, ouça “boas entradas”. E sonho que ninguém complemente com um “e melhores saídas”. Sonho com um país no qual, se eu quiser passar a meia-noite de dia 31 de Dezembro para 1 de Janeiro a atravessar de gatas a segunda-circular, ninguém me chateie. E sonho que nenhum coitado tenha que ouvir gritos de “bom ano!” ou de “um grande 2011, com tudo de bom”. Sonho com uma cidade onde não se ouçam buzinas a apitar ou panelas a bater só porque o calendário avançou tanto como noutro dia qualquer. Sonho com um prédio onde não ouça dos vizinhos "bom ano" para depois na segunda-feira de manhã não me segurarem a porta da rua quando eu tenho nas mãos duas pastas, um chapéu de chuva e dois sacos do lixo, só porque estão atrasados para o emprego. Sonho com pessoas que não achem que no ano seguinte vão ser diferentes só porque têm uma agenda nova. Sonho com um mundo sem fronteiras, mas onde imperem limites para o bom gosto, nomeadamente aqueles que impedem que as pessoas mandem desenfreadas mensagens umas às outras com frases mais feitas que uma fatia de pão de forma no programa 8 da torradeira. Sonho com uma avaria generalizada nos operadores de telemóveis entre as 19 horas de dia 31 e as 13 de dia 1. Sonho com um mundo melhor, no qual a Murganheira não patrocine o Reveillon da TVI.

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*com música.